“União entre pessoas de credos diferentes deve ser pensada”

A afirmação é do empresário Aboobakar Choonara, muçulmano residente nos Açores. Depois de duas uniões com mulheres católicas, entende as declarações de D. José Policarpo, sobretudo por causa da educação religiosa dos filhos.

A ideia de que os casamentos entre pessoas de confissões religiosas diferentes, sobretudo entre católicos e muçulmanos, como alertou anteontem o Cardeal Patriarca de Lisboa, deve ser ponderada, mereceu algum repúdio mas não deixa de merecer a concordância de alguns sectores.
Um dos muçulmanos residentes nos Açores há mais de 20 anos, Aboobakar Choonara, empresário, alerta para as dificuldades que podem surgir. Sobretudo se o casamento se desfizer.
“Há questões que têm de ser bem pensadas sobretudo no que respeita à educação religiosa dos filhos, que têm de ser acauteladas desde o princípio”, alerta este muçulmano  integrado na comunidade local mas que continua a praticar o islamismo, seguindo, diariamente,  os mandamentos do Corão.
Apesar de compreender “algum sentido” nessas palavras, Choonara não deixa de considerar “lamentáveis” as declarações do Cardeal Patriarca, refutando a ideia de que as mulheres que optam por casar com muçulmanos possam estar a “meter-se em sarilhos”, como afirmou o líder da igreja católica portuguesa.
“Bem pelo contrário”, adianta afirmando que “uma mulher que case com um muçulmano, estará mais protegida porque, segundo a lei islâmica, o marido será  responsável  pelo seu sustento e bem-estar permanentes, a menos que ela decida separar-se e volte a casar-se”.
Segundo este muçulmano, os islâmicos “não são menos flexíveis” que os católicos na defesa dos seus princípios religiosos. A interpretação que fazem, desde cedo, das escrituras e a sua adequação à realidade do dia a dia é que é diferente e isso “pode ser considerado inflexibilidade”, remata. No entanto, não tem dúvidas de que as mulheres muçulmanas “têm mais direitos que as ocidentais” e “não há nada na lei corânica que obrigue sequer uma mulher  a abdicar do seu credo para se converter ao islamismo”. Essa obrigação só surge caso ela “não seja seguidora das escrituras, seja a Bíblia ou a Tora”.
Para a Diocese de Angra, a questão também não é pertinente, porque a integração da comunidade islâmica nos Açores é total e a sua expressão muito reduzida. Apenas vivem em permanência nos Açores cerca de 15 muçulmanos, embora a população muçulmana flutuante seja superior, rondando os 60 elementos, sobretudo trabalhadores guineenses.
Embora não haja formalmente qualquer relação, “mantemos algum convívio social pontual com eles”, referiu ao Açoriano Oriental Online o responsável pelo Secretariado Diocesano para a Mobilidade Humana.
No ano passado foram feitas duas celebrações ecuménicas, às quais os muçulmanos, tal como outras confissões religiosas, não faltaram.
“Respeito e amizade” são as duas palavras que Costa Freitas utiliza para apelidar as relações da Igreja Católica com os muçulmanos. Ou com qualquer outra confissão, pois “só nos procuram por razões assistenciais e não espirituais”, acrescenta.
As declarações de D. José Policarpo na Figueira da Foz alertando as jovens portuguesas para” o perigo do casamento com muçulmanos” e as “dificuldades” do diálogo inter-religioso com esta comunidade radicada em Portugal, deixaram a comunidade islâmica “magoada”.

“Cardeal Patriarca foi infeliz” diz AIPA

As declarações do cardeal Patriarca de Lisboa são “infelizes” e ”confundem a parte com o todo”. A opinião foi manifestada ao Açoriano Oriental Online pelo presidente da Associação dos Imigrantes nos Açores (AIPA), Paulo Mendes.
Embora em Portugal os esforços para estabelecer um “verdadeiro e profícuo” diálogo inter-religioso, sejam “menos conseguidos” quando comparados com o procedimento noutros países europeus, “afirmações como esta ainda prejudicam mais a situação”, diz o dirigente da AIPA. Paulo Mendes diz que pessoas com responsabilidade,” como é o caso” de  D. José Policarpo, “não podem ter deslizes destes”, sobretudo “num momento de tensão como o que estamos a viver”. Segundo Mendes, “há extremistas em todas as religiões” e a construção de uma sociedade plural e tolerante só se consegue “se houver respeito”. Por isso, remata, afirmações como esta, ainda que percebendo o contexto, “devem ser evitadas a todo o custo”.

 

in AOriental / Carmo Rodeia

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