Mais de um terço das novas substâncias psicoativas (NSP) apreendidas em 2021 em Portugal foram recolhidas nos Açores, região onde já foram registadas substâncias “nunca vistas” na Europa, revelou hoje a Polícia Judiciaria (PJ).
Em declarações aos jornalistas, a propósito da Jornada de Reflexão sobre NSP, organizada pela PJ na Universidade dos Açores, em Ponta Delgada, a perita responsável pelo Setor de Drogas e Toxicologia do Laboratório de Polícia Científica da PJ afirmou que existe uma “casuística impressionante” daquelas substâncias no arquipélago açoriano.
“Só em 2021, de todas as NSP apreendidas em todo o território nacional, mais de um terço foram aprendidas na Região Autónoma dos Açores”, declarou.
Maria João Caldeira apontou uma “conjugação de fatores”, como a “situação geográfica muito particular” e o preço das “drogas clássicas” que são “mais caras” nos Açores, para justificar a “prevalência” das NSP na região.
“Aparecem cerca de 50 novas drogas por ano em toda a Europa. Em Portugal, temos tido uma média de 10 novas drogas por ano, o que é bastante, sendo que a maior parte delas surgem aqui mesmo nos Açores e na Madeira”, apontou.
Maria João Caldeira avançou que foram identificadas “substâncias nos Açores que nunca tinham sido vistas em toda a Europa”.
“Em 2014 foi feita uma apreensão pequena, de rua, de material na zona da Ribeira Grande. Quando fomos fazer a identificação era a primeira vez que essa substância nos aparecia. Quando reportamos, verificamos que nenhum país da Europa a tinha reportado antes”, destacou.
O diretor nacional da PJ considerou o consumo das NSP como “um fenómeno que começa a ser um flagelo”, tratando-se de um “problema social” e de “saúde pública”, que aumenta a “agressividade das pessoas”.
Luís Neves realçou a necessidade de estudar o fenómeno para apresentar propostas que permitam combater as NFC, cuja criminalização é atualmente um “jogo do rato e do gato” que “gera muito dinheiro” no mercado interacional.
“O que se passa permanentemente é que os produtores e aqueles que comercializam procuram contornar a lei introduzindo novas substâncias químicas que levam tempo a ser detetadas e a entrar no circuito e a ser analisadas”, explicou.
O coordenador de investigação criminal da PJ nos Açores, Renato Furtado, também registou que os Açores são das regiões “em pior situação em termos de prevalência de toxicodependentes”, considerando que o aumento das NSP tem origem nas lojas de drogas legais (conhecidas como ‘smartshops’).
“Isso tem tudo origem nas ‘smartshops’, que chegaram aqui [aos Açores] em 2012 e disponibilizaram essas novas substâncias e os consumidores verificaram que conseguiam obter efeitos análogos às anfetaminas e à cocaína por preços muito mais baixos”, afirmou.
Renato Furtado defendeu que o combate às dependências tem de assentar em “99%” na prevenção.
“Temos de agir na prevenção. Na prevenção dos jovens, na prevenção dos jovens que estão desocupados, que não estão inseridos no sistema escolar, que não estão inseridos no mercado de trabalho”, apontou.
Na ocasião, o secretário da Saúde, Clélio Meneses, afirmou que a aposta do Governo dos Açores também passa pela “prevenção”, “sem descurar o tratamento e a reinserção”.
O governante lembrou que o Plano de Prevenção Para as Dependências está em vigor, mas, reconheceu, precisa de ser “mais eficaz”.
“Este plano de prevenção está a funcionar, mas que não é exatamente aquilo que tem sido feito. Há muitos planos que tem uma base teórica e científica muito bem fundamentada, mas que têm alguma dificuldade em ter eficácia na vida real. Pretendemos que esse plano entre pela sociedade dentro”, concluiu.