Corpo pode ser usado na perspectiva

Enquanto umas se colocam em locais recônditos da cidade, outras auto-promovem-se nos jornais. O número de mulheres que se prostitui em Ponta Delgada não pára de crescer.

Toxicodependência, crise económica e mesmo o vício em sexo faz com que o número de mulheres que se prostituem esteja a aumentar na ilha de S. Miguel. Para os mais atentos, esta problemática é extremamente visível em alguns locais da cidade de Ponta Delgada, nomeadamente na zona da Pranchinha, onde, não por raras vezes, as mulheres fazem abordagens directas aos automobilistas, no sentido de aferir se estes pretendem os seus “serviços”. Os preços variam, sendo que o desespero de algumas faz com que estas vendam o corpo por valores pouco superiores a 20 euros.

 

 

Por outro lado, diariamente, alguns jornais são autênticos veículos de promoção da prostituição, em que as mulheres colocam anúncios a oferecer os seus serviços sexuais.

A reportagem do expressodasnove.pt abordou esta problemática com um sociólogo, para aferir da evolução da mesma nos Açores, principalmente na maior ilha açoriana.

“Perdem-se no tempo as referências à prostituição quer tolerando-a quer punindo-a por a considerarem útil ou censurável. Data do reinado visigótico, ao tempo do Rei Recaredo, a primeira imposição legal punitiva para a prática da prostituição, prevendo a aplicação de 300 açoites e trabalhos forçados à pessoa que vendesse o corpo bem como para os seus familiares, caso fossem cúmplices.

 
Também D. Afonso Henriques manteve o regime de açoites para quem se dedicasse a tais práticas tendo D. Afonso IV iniciado uma certa tolerância ao iniciar a concentração das prostitutas em espaços territorialmente delimitados.

Nunca estudei a problemática nos Açores, mas tenho conhecimento de que, por exemplo, há, nos arquivos policiais, documentos com fotografias de mulheres que na primeira metade do século passado se dedicavam à prostituição fruto do enfoque que institucionalmente era dado às prostitutas no Estado Novo. Hoje as polícias não fazem o tratamento dessa informação, mas, sem dúvida, continua a haver prostituição nos Açores, no sentido tradicional, a par de novas formas bem mais sofisticadas do que no passado”, diz Alberto Peixoto.

 

 

O sociólogo afirma que as autoridades têm conhecimento dos locais em que a prostituição acontece e que estes “são do conhecimento das diversas instituições que intervêm na matéria e de certa forma até de cada um de nós”, considerando que “Entre outros, certas zonas na Calheta e em particular na zona da Pranchinha são alguns desses locais referenciados e tenho inclusivamente conhecimento de intervenções diversas até por parte de instituições de cariz social. Contudo, chamo a atenção para o facto de ser uma área de intervenção difícil. Por um lado, porque a prostituição não é crime e por outro, porque as instituições não conseguem apresentar aos prostitutos/as alternativas capazes de competir com o que a prostituição proporciona do ponto de vista material. A receptividade dos apoios tradicionalmente proporcionados é muito baixa, sendo por norma recusadas todas as tentativas até que se atinja ‘o fosso’, ‘o vazio’!”.

No que toca à motivação para a prostituição, Alberto Peixoto diz que se pode definir três quadros diferentes: “a prática como forma de sustentação da toxicodependência; para ostentar um certo estilo de vida; ou como forma de sustento, estando na base de todas, conforme Moita Flores, a ‘falta de um substrato cultural consciente’.

Para além das motivações enunciadas, recentemente tive conhecimento de uma outra motivação, muito pouco estudada. O caso prende-se com uma mulher que se começou a dedicar à prostituição por ser viciada em sexo. Como não conseguia sentir-se satisfeita sexualmente com o seu parceiro, passou de forma encapotada a dedicar-se à prática da prostituição. Resolveu pedir ajuda quando descobriu que a sua insatisfação sexual permanente e as exigências que fazia aos clientes, levando-os à exaustão, começaram a isolá-la e a torná-la alvo de um processo de rejeição”.

 

 

Crise económica não explica tudo

 

Alberto Peixoto diz que não conhece nenhum estudo que demonstre que as pessoas em situação de crise económica recorram mais à prostituição do que em períodos de crescimento económico.

“A minha intuição diz-me que o sexo tem maior procura nos períodos de crescimento económico. Penso mesmo que tal associação constitui um mito um pouco à semelhança do mito de que em períodos de crise as pessoas cometem mais crimes. Não é verdade Se assim fosse, Portugal, enquanto país da cauda da Europa, cuja situação económica se tem caracterizado praticamente ao longo das últimas décadas por ser de crises atrás de crises, com problemas graves ao nível da pobreza e de atraso nos índices de desenvolvimento humano, deveria destacar-se com taxas de criminalidade acima da média europeia. É precisamente o inverso que se tem registado, países como a Alemanha e a Inglaterra, apesar de bastante mais ricos e menos vulneráveis às crises económicas, têm apresentado taxas de criminalidade muito superiores às portuguesas.

Estudiosos como James Wilson, Julien Dray, Sebastián Roché, entre outros, têm demonstrado que não existe uma correlação entre crises económicas e a prática da criminalidade”.

 

Pedro Botelho – in Expresso da Nove

Pub

DEIXE UMA RESPOSTA

Please enter your comment!
Please enter your name here