A dívida pública dos Açores agravou-se em 365,3 milhões de euros em 2020, atingindo 2.215,4 milhões, sobretudo devido à crise pandémica, mas as finanças públicas já apresentavam desequilíbrios orçamentais desde 2009, alertou hoje o Tribunal de Contas (TdC).
“Numa situação de partida, em que as finanças públicas regionais já exibiam uma posição orçamental estruturalmente deficitária, os desenvolvimentos registados em 2020 acentuaram a deterioração das condições de sustentabilidade da dívida pública regional”, afirmou o TdC.
A conclusão é de um estudo, cujo relatório foi divulgado hoje, que “pretendeu aferir o impacto da crise pandémica nas contas públicas regionais em 2020”, mas analisou também a evolução registada no período 2009-2019, “de modo a contextualizar a situação de partida das finanças públicas regionais para enfrentar a crise”.
Segundo o Tribunal de Contas, o défice orçamental dos Açores “ascendeu a 246,1 milhões de euros”, em 2020, o que representa “um agravamento de 163,2 milhões de euros face ao ano anterior, naturalmente influenciado pelos efeitos da crise pandémica”.
“A magnitude do défice orçamental em 2020 explica, maioritariamente, o significativo agravamento de 365,3 milhões de euros (+19,7%) que a dívida pública regional evidenciou no exercício em causa, atingindo 2.215,4 milhões de euros no final do mesmo”, avançou.
O Tribunal de Contas destaca ainda “a aquisição líquida de ativos financeiros, que envolveu o dispêndio de 55,1 milhões de euros, dos quais 50,5 milhões de euros foram aplicados no reforço do capital social da Sata Air Açores” (companhia aérea regional).
O relatório refere que “as medidas de resposta à crise pandémica implicaram o dispêndio de 77,7 milhões de euros”, mas “a contração de determinadas despesas libertou espaço orçamental para acomodar uma verba de 4,8 milhões de euros”, o que permitiu “atenuar, ainda que ligeiramente”, o impacto da crise sanitária na execução orçamental de 2020.
No entanto, segundo o Tribunal de Contas, a região já apresentava uma situação de desequilíbrio orçamental entre 2009 e 2019.
“Embora tendencialmente tenham evoluído no mesmo sentido, a despesa pública regional excedeu recorrentemente a receita, razão pela qual nos últimos 11 anos que antecederam a pandemia de covid-19 nunca foi atingida uma situação de equilíbrio ou de excedente orçamental, facto que contraria o princípio da estabilidade orçamental, sendo ainda suscetível de condicionar, a prazo, a sustentabilidade das finanças públicas regionais e o respeito pelo princípio da equidade intergeracional”, avançou.
Os desequilíbrios orçamentais acentuaram-se, sobretudo, a partir de 2015, sublinhou o TdC, que destacou que nesse ano rondavam os 58,6 milhões de euros e, em 2019, atingiam os 82,9 milhões de euros, e “até poderiam ter sido mais expressivos, não fosse o facto de as taxas de juro se encontrarem em níveis historicamente baixos”.
Esse desequilíbrio levou, segundo o relatório, a que a dívida pública regional tenha apresentado uma “trajetória de crescimento contínuo”, no período que antecedeu a pandemia de covid-19, “embora se tenha expandido a um ritmo mais acelerado entre 2015 e 2019, período em que se agravou 354,3 milhões de euros – em média, cerca de 88,6 milhões anuais –, fixando-se em 1.850,1 milhões de euros no final de 2019”.
O Tribunal de Contas salienta que a receita registou, no período anterior à pandemia, um “comportamento globalmente positivo”, impulsionada “pelo forte agravamento da carga fiscal” e pela “evolução favorável que a economia regional vinha a evidenciar desde 2015”.
No entanto, alega que a receita fiscal, que aumentou 249 milhões de euros, entre 2009 e 2019, constitui, desde 2013, “a principal componente da receita efetiva da administração pública regional (entre 50 a 58% da verbas arrecadas)”, enquanto a receita não fiscal registou uma “queda de 198,1 milhões de euros”.
Segundo o Tribunal de Contas, a justificação prende-se com uma “redução das verbas provenientes do Orçamento do Estado” de 110,1 milhões de euros, entre 2009 e 2014, e com uma “queda” nos montantes provenientes de fundos europeus, de 48,7 milhões de euros, que é associado a uma regressão do investimento público de “cerca de 50%”.
“No período subsequente, a receita não fiscal recuperou alguma dinâmica, até 2016, exibindo desde então uma evolução irregular mas tendencialmente decrescente”, acrescentou.
Quanto à despesa, o relatório destaca uma “trajetória de crescimento contínuo” das despesas com pessoal e aquisição de bens e serviços, a partir de 2013, “totalizando 855,3 milhões de euros em 2019, importância correspondente a 66,8% da despesa registada neste exercício, que absorveu 71,4% da receita arrecadada no mesmo”.
Já o investimento público “tem vindo progressivamente a perder espaço orçamental”, passando “de 122,2 milhões de euros, em 2009, para 75,8 milhões de euros, em 2019”.
O Tribunal de Contas (TdC) alertou o executivo açoriano para “a necessidade de corrigir o desequilíbrio estrutural das finanças públicas regionais”, alegando que as verbas comunitárias que serão transferidas para a região ao abrigo do NextGenerationEU até 2026 (580 milhões de euros) podem aliviar “transitoriamente” a pressão sobre as condições de sustentabilidade da dívida pública regional, mas “terão um impacto essencialmente conjuntural”.
Em sede de contraditório, a Secretaria Regional das Finanças, Planeamento e Administração Pública, do executivo da coligação PSD/CDS/PPM, que tomou posse em novembro de 2020, adiantou que “após a necessária recuperação económica e social pós-pandemia de covid-19, que se prevê para 2023, a prioridade do Governo Regional passará pela adoção de uma gestão orçamental de contenção de despesas, de modo a criar espaço orçamental que possibilite a redução do recurso ao endividamento e a apresentar saldos primários positivos”.
Lusa