O peso da contratação provisória e a termo, indicador da instabilidade laboral, está acima dos 30% em Portugal e é das mais altas da Europa
3 mil quilómetros separam Portugal e Hungria, mas estes dois países estão bem mais próximos quando o tema é o medo de perder o emprego. Um artigo publicado pelo Instituto para o Estudo do Trabalho alemão (IZA), dos economistas David Bell e David Blanchflower, conclui que portugueses e húngaros são os povos da União Europeia (UE) que dizem ter mais medo do desemprego. Os resultados referem-se ao período de Janeiro de 2008 a Agosto de 2009. O IZA é um dos mais conceituados e produtivos institutos da Alemanha na área de emprego e trabalho.
Este indicador, semelhante aos índices de confiança clássicos e construído com base nos resultados de entrevistas a milhares de pessoas de cada país, mostra que os húngaros são, em média, os europeus mais descrentes relativamente ao futuro próximo do mercado de trabalho. Logo a seguir vêm os portugueses, os gregos e os irlandeses (ver gráfico). No mesmo inquérito, os mais optimistas moram na Polónia, Malta, Finlândia e Eslováquia.
No estudo publicado pelo IZA, os economistas constatam que a crise financeira – que depois assumiu a forma de crise económica – arrasou com os mercados de trabalho da maioria dos países desenvolvidos e colocou milhares de jovens numa situação muito difícil, à qual são completamente alheios. Os autores defendem que os políticos perceberam, genericamente, que eram necessários estímulos às economias, mas não assumiram de forma evidente a prioridade: resolver o problema dos jovens que não têm trabalho ou que vivem na precariedade.
Num estudo encomendado pelo Price’s Trust, uma organização patrocinada pelo Príncipe de Gales que ajuda os jovens britânicos na formação e a encontrar trabalho, David Blanchflower vai mais longe e diz mesmo que a recessão vai conduzir a uma “geração perdida” (ver página 18): pessoas que estudaram mas não encontram emprego ou são mal pagas.
Haverá uma geração dessas em Portugal?
Os especialistas preferem não formular as coisas nesses termos, mas aceitam que os jovens, apesar das qualificações e da educação mais elevada, estão a ser prejudicados. “A idade é um posto, vivemos num país de direitos adquiridos”, atira Eduardo Catroga, ex-ministro das Finanças. “Uma parte do mercado de trabalho ainda funciona segundo um modelo corporativo: os protegidos tentam manter as regalias e os não-protegidos ficam numa posição mais frágil”, constata Pedro Adão e Silva, perito em assuntos laborais.
Glória Rebelo, investigadora do ISCTE, observa que “quanto mais instáveis são os vínculos laborais e quanto mais elevado for o desemprego, maior é a pressão para reduzir salários”. Quem mais sofre com isto “são os jovens”. “A contratação provisória e a termo, um indicador da instabilidade laboral, está acima dos 30% em Portugal e é das mais altas a nível europeu”, acrescenta.
No estudo sobre a realidade europeia, o IZA sublinha que os jovens estão numa situação má por várias razões. O medo de perder o emprego ou de cair no desemprego atingiu, no período de crise, os níveis mais altos de sempre em quase todos os países. Este medo permite que as empresas imponham salários mais baixos (reduzindo ou mantendo custos) aos mais desprotegidos e/ou motivados para entrar no mercado de trabalho – os jovens. Os mais novos estão a ser mais discriminados (sujeitos a vínculos mais precários e a salários, em média, mais baixos) do que outras camadas da população. A vulnerabilidade dos mais jovens não se restringe ao curto prazo e prejudica as oportunidades de longo prazo.
Os economistas concluem ainda que a situação de alto desemprego jovem tem associados maiores custos sociais e de saúde, provocando “cicatrizes permanentes”, sobretudo nos menos qualificados. Ana Verdasca, socióloga do ISCTE, salienta que o medo estará ligado à própria confiança das pessoas nas suas habilitações escolares. Em Portugal, as taxas de insucesso no ensino básico são das mais altas da Europa, daí o pânico quando os tempos são difíceis.
“O medo do desemprego tem ajudado a conter a pressão salarial”, referem os investigadores do IZA. Cálculos citados pelos autores revelam que “seis meses no desemprego aos 22 anos tiveram como resultado um salário 8% inferior no ano seguinte, e mesmo aos 30 e 31 anos, os salários ficaram 2% a 3% mais baixos”.
“Aparentemente, as taxas de desemprego são mais altas entre minorias, menos qualificados e jovens. O receio é que estes níveis de desemprego venham a gerar tensão social e mais crimes”. Bell e Blanchflower criticam as “políticas activas de emprego” dos vários governos europeus, o português inclusive. “Na Europa parece ser pouco evidente que as políticas activas de emprego tenham tido um impacto positivo nos salários”. Em todo o caso, foram úteis para criar postos de trabalho.