Novo pacote de austeridade. O que muda no bolso dos portugueses

crise-euroMaior racionalização no consumo. É desta forma que o secretário-geral da Associação de Defesa do Consumidor (Deco), Jorge Morgado, aconselha os portugueses a enfrentarem as novas medidas de austeridade propostas pelo governo. Cortes nos salários da função pública, congelamento das pensões, menos deduções no IRS e a subida do IVA de 21% para 23% são algumas das propostas do Executivo que, caso recebam luz verde, vão sufocar ainda mais o orçamento dos portugueses. O cálculo é simples: os consumidores vão ter menos rendimento, o que torna o dia-a-dia mais difícil.

“A classe média e a classe média–baixa vão viver um período angustiante”, referiu ao i Jorge Morgado. O responsável vai mais longe e admite que há famílias que não estão preparadas para enfrentar novos cortes no seu orçamento familiar porque “já vivem actualmente situações aflitivas”.

A verdade é que grande parte destas propostas vão afectar sobretudo os funcionários públicos – cerca de 450 mil funcionários ganham mais de 1500 euros por mês, mas este número deverá ser alargado à restante população, já que o ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, admitiu que este exemplo poderá ser seguido pelo sector privado.

 

Menos 735 euros por ano

Vamos a números, um funcionário público que ganhe 1500 euros por mês vai ver o seu ordenado reduzido 3,5%. Feitas as contas, vai receber menos 52,50 euros mensalmente, multiplicando este valor por 14 meses – 12 meses de salário, mais subsídios de férias e de Natal – essa redução irá atingir os 735 euros no final do ano. Além deste corte, o trabalhador terá ainda de ter em conta o efeito do agravamento da contribuição para a Caixa Geral de Aposentações (AGA) e o aumento do IVA.

Aliás, esta subida do imposto vai afectar a generalidade da população, agravada ainda pelo facto de o governo prometer uma revisão das tabelas do IVA. Isto significa que alguns produtos hoje na taxa reduzida (6%), podem ir parar ao escalão máximo. “Os consumidores vão ter de estar ainda mais atentos aos preços e terão de analisar melhor o seu orçamento antes de tomarem uma decisão”, diz o secretário-geral da Deco.

Mas os cortes não ficam por aqui. As famílias terão limites para poderem beneficiar das deduções à colecta, como as despesas de saúde e educação e dos benefícios fiscais. Os limites a impor àqueles incentivos vão depender dos rendimentos dos contribuintes e dos escalões em que se inserem.

A racionalização do seu orçamento será fundamental para aguentar o barco durante os próximos meses. Dê atenção acrescida a onde está a gastar o dinheiro e tente imitar o governo, cortando o mais possível em despesas não essenciais. Compras mais ambiciosas, como casa, carro ou aquele LCD que ficava tão bem na sala, podem ser adiadas.

É também muito importante ponderar a necessidade de se endividar mais. A constituição de um pé de meia é também aconselhável. O seguro morreu de velho e é importante acautelar algum imprevisto. Os especialistas aconselham a ter sempre de lado pelo menos seis ordenados.

 

 

Saiba como o governo lhe vai mexer na carteira:

 

Redução de salários

Medida aplica-se aos funcionários públicos com salários superiores a 1500 euros brutos/mês e até pode esticar-se ao sector privado (ver páginas anteriores). Este corte será progressivo, ou seja, quem mais ganha terá um corte maior. A redução varia entre  3,5% e 10%. A redução vai também incidir sobre todas as remunerações acessórias. O governo pretende com esta medida cortar 5% a massa salarial da função pública.

 

Aumento do IVA

O governo quer aumentar o IVA dois pontos, passando de 21% para 23%. A alteração vem penalizar ainda mais o consumo e a carteira das famílias. Esta medida é uma das mais impopulares e tem gerado controvérsia, principalmente porque este imposto já foi aumentado em Julho. Até à entrada em vigor prevê-se uma verdadeira corrida a determinados produtos, como é o caso dos automóveis.

 

Pensões congeladas

É uma das medidas que castigam mais os que têm rendimentos baixos. As expectativas apontavam para aumentos baixos, em linha com a inflação, mas Teixeira dos Santos foi mais longe. Com o primeiro PEC, alguns pensionistas já tinham sido obrigados a pagar mais impostos. Na prática, quem recebe mais de 1100 euros brutos por mês viu reduzido o montante que era abatido sobre o rendimento sujeito a IRS.

 

Benefícios fiscais

Já previstas no primeiro PEC, as alterações na carga fiscal são uma das medidas que mais dores de cabeça lhe vão dar. Só os mais pobres não vão sentir o corte nos benefícios fiscais do IRS. O impacto começa logo no terceiro escalão – quem ganha mais de 7250 euros ao ano. Quanto mais altos são os rendimentos, mais este corte se fará sentir. A medida deverá penalizar mais de 1,5 milhões de contribuintes.

 

Aumento de descontos para a CGA

As contribuições dos trabalhadores que descontam para a Caixa Geral de Aposentações sofrerá um aumento de um ponto percentual, para os 11%, alinhando-as com a taxa de contribuição para a Segurança Social. Na prática representa mais uma tranche do ordenado que não lhe chega à conta bancária. A medida terá efeito ainda antes de terminar o corrente ano.

 

Abono de Família 

Quem receber mais de 630 euros por mês vai perder o direito a receber abono de família. O governo decidiu extinguir os dois escalões mais elevados do abono e reduzir  25% o abono dos dois escalões mais baixos. A medida vai afectar 1,4 milhões de beneficiários, 383 mil dos quais deixarão de receber qualquer dinheiro de abono. Também esta medida entra em vigor já este ano.

 

Medicamentos 

O corte das comparticipações nos medicamentos entra em vigor já a partir de hoje. O pacote do medicamento reduz as comparticipações do Estado  5%, ao mesmo tempo que avança com uma redução de 6% dos preços dos medicamentos. No entanto, esta segunda medida só entra em vigor a partir de 15 de Outubro. Segundo a Apifarma, tudo isto vai ter um custo superior a 170 milhões de euros por ano para os utentes.

 

Imposto sobre a banca

A nova taxa pode ser aplicada sobre a banca, mas quem a vai sentir na pele são os clientes. Sócrates revelou que o imposto irá incidir sobre o passivo dos bancos e, se for seguido o exemplo de Reino Unido, França e Alemanha, os bancos com um potencial risco sistémico deverão pagar uma percentagem maior sobre o seu passivo. Tudo indica que a banca vai compensar os novos custos com aumentos de spreads e comissões cobradas.

 

 

 Sónia Pinto e Nuno Aguiar, (in i)

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