“O mar estava muito alterado. Tinha ondulação de dois a três metros, vindo de sudoeste, mas mesmo assim andámos num bom ritmo e esta travessia estava a correr como estava previsto. Por causa do estado do mar não foi possível avistar as caravelas do barco de apoio e, por azar, eu toquei com uma das mãos nos tentáculos de uma caravela, que depois se enrolou na outra mão e no meu pescoço”, adiantou, em declarações à Lusa, Christoph Kneppeck.
Depois de já ter nadado entre as ilhas do Pico e do Faial e entre as ilhas das Flores e do Corvo, Christoph decidiu atravessar hoje parte da costa sul da ilha Terceira, entre o ilhéu dos Fradinhos, no Porto Judeu, e o porto de São Mateus, num total de 16 quilómetros (km) contra a corrente.
Partiu às 10:00 e ainda nadou cerca de três quilómetros, durante uma hora, no seu “ritmo normal”, mas as dores do contacto com a caravela portuguesa obrigaram-no a desistir, tendo sido de imediato assistido nas urgências do Hospital da Ilha Terceira.
“Foi azar, porque quando nós fomos de barco do Porto das Pipas aos Fradinhos, em todo o percurso vimos só quatro caravelas ao longo dos 10km”, contou, garantindo que vai “tentar fazer novamente” esta travessia, mas com condições “mais favoráveis”.
Já no dia 15 de julho, quando nadou da ilha do Corvo à ilha das Flores, as caravelas tinham sido a principal dificuldade da prova, que deveria ter sido percorrida em 18km, mas com os desvios acabou por ser feita em 25km.
“Foi uma experiência brutal, completamente fora do normal, porque nesse dia tinha muitas caravelas e foi preciso parar muitas vezes durante a travessia para escapar às caravelas, o que quebra muito o ritmo do nadador”, contou, lembrando que um colega de prova teve de ser assistido no centro de saúde, na ilha das Flores.
Hoje, na travessia que designou como “contracorrente”, Christoph propunha-se a fazer um percurso mais difícil, sozinho e num sentido que julga ninguém ter tentado antes, não só pelo desafio físico, mas pela mensagem que pretendia transmitir.
“Esta designação a nível pessoal faz todo o sentido, porque estou numa fase da vida complicada em que estou a enfrentar muitas correntes adversas”, salientou.
A viver desde 2005 na ilha Terceira, Christoph Kneppeck começou a nadar há seis anos para aliviar as dores das artroses, mas descobriu que a modalidade tinha outros benefícios.
“Estou doente já há algum tempo com uma depressão e eu descobri que para mim a natação é o meio mais eficaz de aliviar esta doença”, revelou.
A doença, que, segundo Christoph, ainda é alvo de muito estigma, provoca-lhe “insónias, falta de apetite, incapacidade de tomar decisões, autoisolamento social, angústia, ataques de pânico, forte sentido de culpa e forte sentido de ter falhado”.
“Não sou uma pessoa doida ou uma pessoa incapaz de fazer uma piada ou rir-se de uma coisa, mas tenho outros sintomas que não são tão visíveis para as pessoas. As pessoas veem-me na rua e acham que eu estou a passar férias”, lamentou.
O cansaço que sente após grandes travessias no mar ajuda-o a ter mais apetite e a dormir melhor durante a noite.
“É mesmo uma terapia. Às vezes quando vou para fora e não posso treinar durante alguns dias, sinto logo os níveis de stress a subir, sinto angústia e outros sintomas da depressão. Não cura a depressão, mas ajuda bastante a aliviar os sintomas mais fortes”, frisou.
Além da prática de exercício físico, a natação em alto mar dá-lhe uma sensação “completamente diferente” e um desafio maior, devido às correntes e às surpresas que a natureza reserva.
“Já me aconteceu ter golfinhos a nadar perto de mim, já passei por cima de raias e de ratos do mar. Já tive cardumes de peixe que me acompanharam durante 10, 20 minutos”, contou.
Quando entra na água esquece os perigos que possam estar à sua volta e o esforço físico que terá pela frente, focando-se apenas “em cada braçada”.
“Eu gosto quando o mar está diferente, quando está alterado, quando tem ondulação. Para mim torna até às vezes a natação mais interessante”, revelou.
Lusa