“As equipas das casas de abrigo e dos centros de atendimento estão muito sós para cuidar das vítimas. Na maioria das situações não há rede de trabalho, quer na articulação com a saúde mental, com os tribunais, com as autarquias, com a habitação ou com o Instituto de Emprego”, afirmou Maria José Magalhães. A responsável falava à Lusa à margem de um seminário sobre esta temática realizado no âmbito do projeto “Amor, Medo e Poder: percursos de vida para a não-violência”. Maria José Magalhães, que coordena a investigação, frisou que os profissionais dos centros de atendimento e das casas abrigo “estão completamente sós neste trabalho, sobrecarregadíssimas com este peso e esta responsabilidade de cuidar das vítimas e de lhes proporcionar um caminho de volta a uma vida sem violência”. “Pelo lado das vítimas, o que podemos sentir é que as suas vozes não são ouvidas. O que elas querem ou desejam não é tido em conta, sentem que as instituições não acreditam nelas e que continuam aliadas dos agressores”, afirmou. Da pesquisa até agora realizada, os investigadores concluem que “a sociedade continua sem realmente compreender a perigosidade e o grau de criminalidade que está aqui envolvido” e defendem “programas de reeducação” para os agressores. “Eles não são uns estranhos a esta sociedade, são o exemplo mais extremado daquilo que a sociedade faz de forma geral a todas as mulheres e, por isso, precisamos é de mudar a cultura, mudar a educação de homens e de mulheres para que deixemos de falar em ‘bestas’ e passemos a falar em pessoas”, considerou. Contudo, Maria José Magalhães reconhece que, em Portugal, em 10 anos, se deu “um salto correspondente a 30 anos” e que se verifica “uma ligeira diminuição” deste fenómeno. “Significa que de uma em cada três passou, eventualmente, para uma em cada quatro mulheres, o que ainda é muito elevado, porque são muitas mulheres, muitas crianças e famílias a sofrer”, disse. O projeto “Amor, Medo e Poder: percursos de vida para a não-violência” investiga até finais de agosto os principais focos de violência doméstica nas cidades do Porto, Coimbra, Lisboa/Setúbal e Viana do Castelo em mulheres de diferentes faixas etárias. Maria José Magalhães sublinha que a avaliação das respostas sociais à violência é crucial para compreender a forma como o problema pode ser combatido. No seminário, a decorrer na Faculdade de Psicologia da Universidade do Porto, os participantes discutem temas como a “Violência de género e narrativas biográficas” ou a “Violência de género e cidadania das mulheres”, entre outros. O projeto de investigação “Amor, Medo e Poder: percursos para a Não-Violência” é financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia e pela Comissão Cidadania e Igualdade de Género, e apoiado pelo Centro de Investigação e Intervenção na Educação da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto e pela União de Mulheres Alternativa e Resposta.
A falta de articulação entre diferentes instituições que lidam com o fenómeno da violência doméstica foi hoje apontado, no Porto, como o principal obstáculo ao trabalho dos profissionais das casas abrigo e de atendimento.