Meia centena de pessoas sem-abrigo a viver há muito tempo nas ruas de Lisboa vão entrar num projecto inovador que lhes dará primeiro uma casa digna para morarem e depois as ajudará a comandar as suas vidas sozinhas.
O Projecto Casas Primeiro, que arrancou este mês, prevê apoios ao arrendamento e acompanhamento para 50 pessoas sem-abrigo e com doença mental da cidade de Lisboa.
A equipa, coordenada pelo professor José Ornelas, da AEIPS e do Instituto de Psicologia Aplicada (ISPA), vai desenvolver o projecto ao abrigo de um protocolo entre o Instituto de Segurança Social e a Associação para o Estudo e Integração Psicossocial (AEIPS).
“Uma pessoa que permanece na rua não tem disponibilidade mental para se tratar porque esgota toda a sua energia para sobreviver às ameaças e aos riscos, aos problemas da noite e do dia”, explicou José Ornelas, em declarações à Lusa.
Segundo o responsável, a intervenção assenta no modelo Housing First, que tem como elementos centrais a triagem das situações com base em diagnóstico especializado, habitação permanente e integrada, casas individualizadas e separação entre habitação e tratamento.
O modelo foi já aplicado em cidades como Nova Iorque (Estados Unidos) e Toronto (Canadá), tendo demonstrado elevados níveis de sucesso. “Descobriu-se noutros países que, se proporcionarmos uma abordagem individualizada e integrada, as pessoas saem mais rapidamente da rua e integram-se na sociedade”, disse.
Para além de apoios na obtenção e manutenção de uma habitação estável e integrada na comunidade, as pessoas vão ainda poder beneficiar dos serviços de apoio ao emprego, educação e formação que a AEIPS presta há mais de 20 anos.
O primeiro contacto com a população sem-abrigo de Lisboa é feito por organizações que já trabalham com estas pessoas no terreno e que estão a identificar aquelas que poderão entrar no programa.
Os que já estão há mais tempo na rua e com problemas do foro da saúde mental serão os primeiros a ser seleccionados.
Nos próximos quatro meses, adiantou, 20 pessoas nestas condições vão passar a viver numa casa, acompanhados pela equipa, num processo gradual, até à sua autonomização.
Nos quatro meses seguintes o mesmo acontecerá com outros 20 sem-abrigo e depois mais dez até à conclusão do projecto, que, segundo José Ornelas, pretende generalizar-se.
“Vamos tentar demonstrar que isto resulta, que é mais eficaz e que em termos de custo-benefício é muito mais barato do que outras medidas”, disse.
O projecto conta com a colaboração do ISPA e de especialistas internacionais.
Só em Lisboa existem, segundo dados da Santa Casa da Misericórdia, cerca de 1150 pessoas sem-abrigo, na maioria homens portugueses, alcoólicos e com idades entre os 34 e os 44 anos.
Um levantamento recente da equipa de rua da Câmara Municipal de Lisboa revelou que as freguesias dos Anjos (9,5 por cento) e do Socorro (8,4 por cento) são as que albergam mais sem-abrigo.
O projecto House First é uma das medidas previstas na Estratégia Nacional para a Integração das Pessoas Sem-Abrigo 2009-2015, que incide em três áreas específicas: prevenção, intervenção e acompanhamento.
Organizada pelo Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, em conjunto com outras entidades públicas e privadas, a estratégia pretende coordenar os recursos existentes e criar uma base de dados que permita saber quem são e onde estão os sem-abrigo em Portugal.
O Instituto de Segurança Social, entidade que coordena a estratégia, tem até 2015 uma verba de 65 milhões de euros para desenvolver a base de dados.
Lusa