No ano passado venderam-se mais de 263 mil unidades, segundo dados da consultora IMS Health.
As estimativas da empresa mostram uma inversão na tendência de estagnação de venda da pílula do dia seguinte, que vinha a sentir-se desde 2006.
Entre dezembro de 2009 e novembro de 2010 foram vendidas 263 mil unidades, mais 46 mil do que no período homólogo anterior.
Especialistas contactados pela agência Lusa têm dificuldade em interpretar o fenómeno. “Não encontro nenhuma explicação para este aumento”, disse o presidente da Sociedade Portuguesa de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal, Luís Graça.
Também o presidente da Sociedade Portuguesa de Ginecologia e Obstetrícia, José Martinez Oliveira, estranha o crescimento, arriscando uma hipótese: “Existe uma nova postura social que poderá estar associada ao facto de as pessoas já não usarem os métodos de contraceção regulares”.
Vendida como uma solução de emergência para um acontecimento inesperado, algumas pessoas viram na pílula do dia seguinte um método contracetivo regular. “Há casos em que usam sempre que têm uma relação sexual”, criticou José Martinez Oliveira.
À Maternidade Júlio Dinis, no Porto, chegam mulheres para quem a toma desta pílula já se tornou um hábito. “Conheço casos que já a usaram dez e quinze vezes”, contou Serafim Guimarães, ginecologista há 35 anos na maternidade portuense.
Colocada no mercado em 2000, a pílula do dia seguinte foi tendo um aumento gradual de utilização durante os primeiros seis anos. Em 2006, as vendas estagnaram, rondando as 220 unidades anuais.
Luís Graça lamentou a falta de informação dos portugueses na área da sexologia: “As mulheres utilizam-nas nas situações mais disparatadas. Há mulheres que nem sequer têm noção do seu próprio ciclo menstrual”. No entanto, todos os especialistas salientam a importância deste produto no mercado.
“A pílula do dia seguinte é uma arma importante que teve um impacto na redução das gravidezes indesejadas”, sublinhou a coordenadora das consultas de mães adolescentes grávidas na Maternidade Alfredo da Costa, Ana Isabel Machado.
A legislação que em 2007 veio legalizar a interrupção voluntária da gravidez (IVG) também poderá ter alterado a forma de utilizar a pílula do dia seguinte. Em 2008, as farmácias e parafarmácias registaram um decréscimo de dois por cento nas vendas: 216 799 unidades vendidas. Para alguns especialistas, as IVG têm um peso na história da primeira década da pílula do dia seguinte em Portugal.
“Há a perceção em vários centros (hospitalares) de que as pessoas usam a interrupção voluntária da gravidez como método de acabar uma gravidez. Há pessoas que já fizeram mais do que uma interrupção, porque a veem como uma solução fácil para o problema”, alertou José Martinez Oliveira, explicando que já casos que já nem recorrem à pílula de emergência.